E, a vida é assim ...
O frio entrava pelas dobras do cobertor quadriculado de um amarelo claro aquecendo-me o peito num dos dias mais intrigantes de uma nova crise asmática. Ajoelhado aos meus pés balançando a cadeira num misto de tristeza contida e alegria disfarçada no sorriso, ele me beijava as mãos, bochechas, beliscava de um lado, beijava do outro numa despedida difícil. Foi a última vez que seus olhos cruzavam os meus. Últimos beijos, último sorriso. Eu, Sete anos. Ele toda uma vida pela frente, não fosse o fim do caminho. Desta lembrança me sobrou a infinita saudade. Não fiz análise, não procurei nas esquinas, nem em nenhum olhar. Não permiti que a vida borrasse este momento. Não deixei que vida me roubasse aquela ternura. Pela vida afora não decidi um dia para homenageá-lo, nem para querê-lo um pouco mais. Mas, eis que a vida tem trapas e trapaças .
Primeiro foi o Marcello – depois Eduardo. Dois grandes amores invencíveis. Dois garotos. Fui mãe e pai – a la vez - vivi todas as febres, fraldas, clandestinidade, sequestro, exilio, o primeiro diploma, as tardes de repasse das matérias, a confissão lindamente terna da primeira noite de amor, as brigas, o amor cotidianamente. Vivemos todas as emoções possíveis. Juntos, inseparáveis.
Numa fria madrugada de abril, Edu e Márcia nos regalaram mais um nó desta rede afetiva - Nicholas – minha doce e eterna paixão. Dois anos, depois Vitória saltou todas as convenções, rompeu a bolsa dentro do elevador estabelecendo uma nova ordem.
- Pega o Nicholas leva devagarinho enquanto corro com a Márcia para o São Vicente porque a Vitória vai chegar – pede edu ao telefone
Eduardo os tomou nos braços, trocou fraldas, preparou mamadeiras. Cedo entra no sype o face rapidinho, diz duas ou três palavras comigo, misturado ao - Pai vem vamos chegar atrasado e, a Vitória – quase chegando aos 15 - não acabou ainda de arrumar o cabelo. Nicholas já tem 16 anos. Muitos riachos chegaram ao mar.
Marcello – tal qual Neruda confessa que viveu – Nunca deixou as últimas notas ocuparem seu boletim escolar – uma vez que outra na matemática, nada que não fosse normal em todas as latitudes – até que descobriu a paixão pela redução de códigos .
No gingado do bloco de sujos – sua paixão deste os dois anos, Pablo foi se formando até alcançar a maturidade para conhecer as estrelas. Sob o signo de sagitário no mesmo mês em que Cell e edu como mera casualidade haviam decidir habitar o planeta terra.
Vaya casualidad– diz Nelson Dominguez – um dos maiores pintores da atualidade . 11, 17 e 15 de dezembro numa simples e doce confabulação do universo transformaram o dia 10/ 12 aquela tristeza imensamente triste, no nosso porto onde sempre vamos Carenar.
Marcello adora Pablo, que ama Marilia, que é apaixonada pelo Edu, que é louco pela Vitória, que idolatra Nicholas, que ama de paixão a Márcia.. dessa história fazem parte outras tantas personagens queridas amadas num redemoinho de sonhos, de luta e todo amor que ainda houver nesta vida.
Se somos felizes – pergunta o amigo de todas as horas – Alguém dúvida?