1966 -
Laranjeiras, bairro bucólico onde o bondinho fazia a volta lá no largo do Cosme Velho. Tranqüilo, cantado em verso e prosa pelo escritor maior Machado de Assis era o sonho de todo carioca. O fascínio do bairro nobre onde o cheiro discreto do mar se misturava ao olor do verde ,abençoado pelo Cristo encravado aos seus pés. Laranjeiras incitava ao pensamento, quiçá daí ter tido tantos revolucionários na história recente do Brasil.
A ditadura seguia seu rumo destruindo famílias, infiltrando-se nas faculdades, mapeando nossas vidas. Nós buscávamos saídas. Aliar o estudo era um deles. Estudávamos para o vestibular da UERJ – Íamos fazer Direito. Tudo na ponta da língua. Terminara a faculdade de Letras, mas o sonho maior era conhecer as leis para fazer justiça.
Fausto, fora buscar-me. Entramos na Rua das Laranjeiras pela Pinheiro Machado vindos da Moura Brasil pertinho do Fluminense. De repente, o aguaceiro numa onda gigantesca carregava tudo.O imaginável. Colchões, lixo, pedaços de madeira, latas numa onda barrenta arrastando a vida. Só impossível transpor o caos. Subi em seus ombros para fazer peso, livrar de um fusca a mercê da correnteza forçando a passagem. Entre gritos de socorro e solidariedade todos os que se abrigavam no bar da esquina fizeram uma corrente humana e nos sacaram das águas. Na escuridão da noite, recompúnhamos da tragédia quando noticias começaram chegar de todas as vozes. A Rocinha e o Vidigal estão desmoronando. É preciso ajuda. Urge socorrer esta gente. Não sei se duas ou três horas depois montados em caminhões de lixo subíamos a encosta para socorrer os favelados. Passados 45 anos ainda posso ouvir os gritos de homens, crianças e mulheres despencados morro abaixo.
Quarenta e cinco anos, depois da tragédia das águas de 1966, o Brasil vê atônito a cada temporada de chuvas a tragédia anunciada.Milhares de pessoas perderam suas vidas ou abrindo ou fechando o verão. Cidades serranas, comunidades derretem com o poder avassalador das águas, qual filme de terror.
A quem cobrar, neste momento as mortes de mais de 400 pessoas já publicadas, a recuperação emocional pelas noites e dias passados em improvisados abrigos, as perdas de bens tão dificilmente adquiridos: as águas fonte de vida, indispensável a sobrevivência ou aos governantes inescrupulosos que acumulam riquezas sob os cadáveres e as angústias de um povo anestesiado pelos sucessivas catástrofes que ano trás anos invadem suas sofridas vidas?
Que fizemos todo este tempo, senão olhar em tempo real uma repetida tragédia?
Hoje, temos maturidade suficiente para nos organizar e decidir nosso destino. Cobrar cada pedacinho perdido dos nossos sonhos, cada trecho desviado de nosso destino. Socorrer agora é nosso dever. Amanhã, organizar a sociedade civil, única saída para cobrar responsabilidade e reorganizar o Brasil. Caso contrario, continuaremos chorando nossos mortos. Porque a Justiça faz muito fechou os olhos e anda adormecida em algum banco de praça da sua cidade.
Laranjeiras, bairro bucólico onde o bondinho fazia a volta lá no largo do Cosme Velho. Tranqüilo, cantado em verso e prosa pelo escritor maior Machado de Assis era o sonho de todo carioca. O fascínio do bairro nobre onde o cheiro discreto do mar se misturava ao olor do verde ,abençoado pelo Cristo encravado aos seus pés. Laranjeiras incitava ao pensamento, quiçá daí ter tido tantos revolucionários na história recente do Brasil.
A ditadura seguia seu rumo destruindo famílias, infiltrando-se nas faculdades, mapeando nossas vidas. Nós buscávamos saídas. Aliar o estudo era um deles. Estudávamos para o vestibular da UERJ – Íamos fazer Direito. Tudo na ponta da língua. Terminara a faculdade de Letras, mas o sonho maior era conhecer as leis para fazer justiça.
Fausto, fora buscar-me. Entramos na Rua das Laranjeiras pela Pinheiro Machado vindos da Moura Brasil pertinho do Fluminense. De repente, o aguaceiro numa onda gigantesca carregava tudo.O imaginável. Colchões, lixo, pedaços de madeira, latas numa onda barrenta arrastando a vida. Só impossível transpor o caos. Subi em seus ombros para fazer peso, livrar de um fusca a mercê da correnteza forçando a passagem. Entre gritos de socorro e solidariedade todos os que se abrigavam no bar da esquina fizeram uma corrente humana e nos sacaram das águas. Na escuridão da noite, recompúnhamos da tragédia quando noticias começaram chegar de todas as vozes. A Rocinha e o Vidigal estão desmoronando. É preciso ajuda. Urge socorrer esta gente. Não sei se duas ou três horas depois montados em caminhões de lixo subíamos a encosta para socorrer os favelados. Passados 45 anos ainda posso ouvir os gritos de homens, crianças e mulheres despencados morro abaixo.
Quarenta e cinco anos, depois da tragédia das águas de 1966, o Brasil vê atônito a cada temporada de chuvas a tragédia anunciada.Milhares de pessoas perderam suas vidas ou abrindo ou fechando o verão. Cidades serranas, comunidades derretem com o poder avassalador das águas, qual filme de terror.
A quem cobrar, neste momento as mortes de mais de 400 pessoas já publicadas, a recuperação emocional pelas noites e dias passados em improvisados abrigos, as perdas de bens tão dificilmente adquiridos: as águas fonte de vida, indispensável a sobrevivência ou aos governantes inescrupulosos que acumulam riquezas sob os cadáveres e as angústias de um povo anestesiado pelos sucessivas catástrofes que ano trás anos invadem suas sofridas vidas?
Que fizemos todo este tempo, senão olhar em tempo real uma repetida tragédia?
Hoje, temos maturidade suficiente para nos organizar e decidir nosso destino. Cobrar cada pedacinho perdido dos nossos sonhos, cada trecho desviado de nosso destino. Socorrer agora é nosso dever. Amanhã, organizar a sociedade civil, única saída para cobrar responsabilidade e reorganizar o Brasil. Caso contrario, continuaremos chorando nossos mortos. Porque a Justiça faz muito fechou os olhos e anda adormecida em algum banco de praça da sua cidade.